Entre a digitalização como percurso inevitável do progresso e adaptação do sector, a educação e sustentabilidade tomam a agenda do Printalks, que procura integrar desafios e soluções com rasgo.
Para o ex-diretor de produção do grupo LeYa, Rui Cruz, a educação é uma “preocupação estrutural do sector” face à necessidade de quadros qualificados.
“Num mundo em que as minúcias da vida e do trabalho, das técnicas e das profissões, se alteram diariamente, quando não ainda com maior frequência, a única qualidade humana capaz de fazer frente a tudo isto é a inteligência”. Esta frase foi partilhada por João Lobo Antunes, em 1994, aquando da publicação da sua primeira coletânea de ensaios, e é um dos exemplos que testemunha a urgência de um “ensino correto em condições propícias”, tido como “necessidade constitutiva” pelo ex-diretor de produção do grupo LeYa, Rui Cruz.
Já lá vão mais de 20 anos desde que Rui Cruz iniciou carreira no sector gráfico, dando azo àquela que seria, à partida, uma manifestação natural do seu dote genético, já que é filho de pai tipógrafo. Na altura, o perfil dos que se queriam técnicos de artes gráficas implicava, entre publicidade, orçamentação e comunicação, competências de gestão desde a entrada da matéria-prima ao acabamento do produto, que seria embrulhado e levado ao camião, esperando que chegasse ao destino. “Hoje tudo é digital”, confirma.
O processo de transição para um ecossistema baseado na tecnologia e no digital deveu-se, em parte, ao período de prosperidade que a crise de 2008 encerrou. “Os valores de investimento em equipamentos, formação, mão de obra ou em novas tecnologias atingiram valores muito baixos durante mais de oito anos”, revela o diretor da licenciatura em Design e Tecnologia das Artes Gráficas do Instituto Politécnico de Tomar (IPT).
“Os valores de investimento em equipamentos, formação, mão de obra ou em novas tecnologias atingiram valores muito baixos durante mais de oito anos”
Miguel Sanches, IPT
A indústria parece, no entanto, dar sinais de readaptação, já que se verificam restruturações e redefinições estratégicas, apresentando-se como um contributo para uma “conjuntura mais positiva de um sector em renovação”, crê Miguel Sanches, não deixando de admitir que, dada a natureza do tecido empresarial da produção gráfica “existe ainda uma grande resistência à mudança”.
Mas num ecossistema laboral que perspetiva a emergência de formas não convencionais de trabalho, decorrentes do desenvolvimento exponencial da tecnologia, que mudanças impregnaram nos modelos pedagógicos? Prever ou vaticinar os efeitos das transformações no mercado de trabalho figura-se tarefa árdua. Um estudo lançado em 2013, por Carl Frey e Michael Osborne, que calcula o risco de automação e dependência tecnológica de 702 profissões, aponta para uma percentagem de 59% de possibilidade de o mister de operador de máquinas ser desempenhado por robots.
O setor gráfico tem sofrido mudanças estruturais nos últimos anos. Apesar do baixo nível de qualificação dos trabalhadores, o perfil de um colaborador de uma empresa gráfica tem vindo a tornar-se mais exigente, daí que “a cada nova indústria gráfica terá sempre que corresponder um novo perfil de estudante”, nota Miguel Sanches. “Os empresários procuram, cada vez mais, colaboradores que tenham uma visão completa do setor e sejam capazes de pensar estrategicamente no negócio da impressão”.
Face a uma relativa fragilidade estrutural na economia, que não parece constituir um desassossego imediato para os portugueses, a definição dos modelos pedagógicos deve considerar os registos evolutivos do setor. “A tendência assenta na definição dos objetivos e do produto e têm registado evoluções positivas, baseada numa matriz politécnica”, confessa o docente do IPT, frisando ainda que “a última revisão do plano curricular ocorreu há cerca de 5 anos, e o Instituto tem noção de que é necessário voltar a fazer alguns ajustes”.
As afinações nos planos de estudo devem procurar uma resposta veloz às necessidades das empresas, correndo, a curto prazo, o risco de inadaptação. “O príncipe que confia unicamente na sorte está perdido assim que ela muda”, escrevia Maquiavel no século XVI. A revolução tecnológica e a metodologia de trabalho não convencional caminham a passo acelerando que exige o entender da natureza do tempo atual para que as ações se revelem para com ele harmoniosas.