O papel está a um preço nunca antes visto e a falta do mesmo fez com que seja elevado a estatuto de “ouro”.
Em 28 anos a trabalhar nesta área, é a primeira vez que sinto que ando literalmente aos papéis. Como se já não bastasse a grave crise que vivemos com a pandemia e as suas sucessivas vagas, o mundo resolveu presentear-nos com uma guerra no seio da Europa, uma greve de meses de uma das maiores papeleiras do mundo e, um aproveitar sem precedentes de todos estes males que vivemos.
O papel está a um preço nunca antes visto e a falta do mesmo fez com que seja elevado a estatuto de “ouro”.
Este novo problema, está a enlouquecer a indústria gráfica, onde várias empresas tentaram fazer um stock sem saberem o preço do que estavam a comprar (veio a moda do open price), o que faz com que os preços orçamentados não façam qualquer sentido, o que provocou a desconfiança do cliente final, que não sabe a que preço lhe vai chegar o seu produto e muitas vezes acrescido de taxas extras.
Esta loucura, está a fazer com que os níveis de stocks dentro das empresas estejam a atingir valores astronómicos, o que está a provocar um enorme estrangulamento de tesouraria, e pode mesmo estar a colocar em causa o normal funcionamento das mesmas.
Vejo a discussão muito centrada no tópico do papel, mas para além do papel, o mercado das matérias-primas e subsidiárias está igualmente a sofrer um aumento de preços e uma escassez dos mesmos e os tempos de entrega regrediram anos, aquilo que estávamos habituados a receber em 24h pode passar a semanas ou mesmo meses.
Se não bastassem todas as dificuldades em arranjar as matérias-primas, agora somos bombardeados com os preços astronómicos da energia elétrica, do gás e dos combustíveis. Onde é que vamos parar?
Não consigo ter uma visão clara sobre o futuro, mas confesso-me algo pessimista em relação ao mesmo para a nossa indústria, pois temo que o preço possível de praticar não seja suficiente para colmatar os custos reais que enfrentamos, e não vejo muitas das vezes os clientes com a capacidade de colocarem os seus produtos no mercado com os preços devidamente atualizados.
A sensação que tenho, é que uma grande parte desta nossa indústria na Península Ibérica vai desaparecer neste ano de 2022, que a compra de produtos gráficos impressos vai diminuir rapidamente e as tiragens vão voltar a diminuir.
Se as matérias-primas e subsidiárias subiram em média 30%, a energia tem uma subida a rondar os 100%, o gás pode atingir para algumas empresas mais de 600% de aumento, não vamos conseguir sobreviver se não alteramos significativamente os preços de venda, reestruturar as empresas acabando com as gorduras, voltando a visitar todos os processos produtivos tentando diminuir desperdício e tempo, poupar energia (aqui mudar hábitos e formas de produzir e os próprios horários de produção), arranjar alternativas energéticas e em modo de brincadeira começarmos a produzir sem energia, gás e se possível sem papel.
Não sou uma pessoa negativa, nem acredito que o nosso mundo vai acabar, vejo também algumas oportunidades e talvez uma forma de nos reinventarmos mais uma vez, o único problema é que as mudanças estão a acontecer a um ritmo muito superior nos últimos 3 anos e ainda não saímos de um problema já estamos a enfrentar outro.
Gostava de ter uma escrita mais esperançosa, mas realmente os tempos são que são.